segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Não Dizimo. Sou Ladrão?

Publicado por @paoevinho em Categoria: Odres Novos

ladroesEm meu artigo O Dízimo na Bíblia e na História, coloco diante da Igreja de Cristo algumas de minhas objeções à prática do dízimo obrigatório, tanto de um ponto de vista bíblico como histórico. O Evangelho deveria ser as boas novas de Deus ao pobre. Entretanto, na maneira como tem sido apresentado, acaba sendo uma forma de opressão ao pobre quando o assunto é finanças. Conheço cristãos sinceros que vivem sob acusação pelo fato de não terem condições de dizimar sem ter escolher entre fazer uma oferta na Igreja, ou suprir suas necessidades básicas.

Por muito tempo, ouvi dizer que se o pobre tem que decidir entre pagar o aluguel e dizimar, que deve “honrar a Deus” (pagando o dízimo) e que Deus o honrará. Mas onde encontramos bases bíblicas para colocar o pobre nesta situação?

A Igreja ensina que o pobre deve dizimar, e que Deus o abençoará um dia. É como se o Senhor tivesse uma conta bancária em algum lugar da estratosfera espiritual e um dia pagará com juros tudo aquilo que o fiel investiu na instituição religiosa. Infelizmente, o ensinamento de que “dizima que Deus te abençoa” é somente um lado da verdade. No Novo Testamento, o pobre era abençoado por meio da Igreja (Atos 2:44-45, Atos 4:34-35, Atos 6). Hoje, a Igreja cobra o dízimo do pobre, ensinando que Deus abençoa o dizimista, mas muitas vezes se recusa ser parte deste processo.

O dízimo não é um imposto religioso. Como já disse no artigo anterior:

O dízimo da Lei equivalia às primícias da lã da tosquia das ovelhas e dos primeiros frutos da colheita, portanto, somente os donos de rebanhos e de terras eram obrigados a dizimar. O pobre dava voluntariamente, mas não era obrigado a dizimar. Pelo contrário, o pobre colhia as sobras da colheita dos donos de terras (Dt. 24:19-21) e se beneficiava dos dízimos dos mais prósperos (Dt 26:12-13). Jesus e seus apóstolos não dizimavam, pois não eram donos de terras ou de rebanhos (eles eram considerados pobres e inclusivem se benefeciavam da Lei das sobras da colheita – Mateus 12:1-2). O imposto do templo era o único tributo compulsório pago por Jesus e seus discípulos (Mat. 17:24-27).1 Portanto, a maioria daqueles que usam Malaquias 3:9-10 para ensinar sobre o dízimo, chamando o pobre que não dizima de ladrão, não tem a menor idéia daquilo que está falando. Quem obriga o pobre a dizimar, de forma legalista, não pratica o dízimo nem da Antiga e nem da Nova Aliança.

Duas teses

Estas são as teses de números 46 e 47 das 95 que Lutero formulou:

[46] Deve-se ensinar aos cristãos que, se não tiverem bens em abundância, devem conservar o que é necessário para sua casa e de forma alguma desperdiçar dinheiro com indulgência.

[47] Deve-se ensinar aos cristãos que a compra de indulgências é livre e não constitui obrigação.

Suponho que, nos dias atuais, estas teses devam ser atualizadas (substituindo-se a expressão “compra de indulgências” por “dízimos e ofertas”) e pregadas, desta vez não ao papado, mas à Igreja Protestante. As Escrituras nos ensinam a coletar dinheiro dos mais abastados para o auxilio ao pobre. Não nos mandam tirar o dinheiro do pobre para aplicar em obras que não sejam de caridade.

Considerações práticas

Qualquer oferta na Casa de Deus deve ser um ato de adoração (e não de coação), de acordo com a consciência e fé de cada um. Viver de forma egoísta desonra a Deus e se este têm sido seu caso, arrependa-se. De fato, se você tem para dar para o Reino e não o faz, está sendo negligente. Se alguém, no entanto, tem algum problema e não está em condições de pelo menos dizimar na Casa de Deus, tal fato não deve causar-lhe sentimento de condenação, somente desafiá-lo a estabelecer uma meta diante de Deus para reorganizar suas finanças - de modo a que possa contribuir com a obra de Deus com pelo menos 10% de sua renda.

Sugiro algumas coisas bem práticas a todos os que não podem pelo menos dizimar hoje: no caso daqueles que não tem dívidas e querem participar do privilégio de semear na obra do serviço aos santos, comece aos poucos, se você acha que seu orçamento hoje não comporta uma doação de pelo menos 10% de sua renda. Firme um propósito com o Senhor de dar gradativamente (1% ao mes, por exemplo) e ir subindo de acordo à properidade que o Senhor trará à sua vida. No caso dos endividados ou daqueles que têm dificuldade em disciplinar-se financeiramente, peça a Deus que:

  1. Ajude-o a disciplinar-se na área financeira, não entrando em dívidas de bens ou serviços não essenciais, pelo menos até que você esteja em condições de abençoar a obra de Deus financeiramente;
  2. Que o ajude a pagar suas dívidas, pois a dívida é uma forma de escravidão (Prov. 22:7);

Para os que estão em uma situação crítica, “afogados em dívidas”: agarre uma tesoura e ponha um fim em todos os seus cartões de crédito. Cancele o cheque especial. Depois disso, preocupe-se somente em pagar seus credores, pois é melhor que o faça antes de começar a ofertar na Casa de Deus de forma meramente legalista.

O Senhor Jesus nos ensina que antes de oferecer uma oferta ao Senhor, devemos pagar o que devemos ao nosso adversário, antes que ele acione a justiça contra nós (Mat 5:23-26). A Escritura é lida pelos evangélicos como se ela tratasse somente de uma reconciliação entre irmãos, mas se ignora que o Mestre se refere ao pagamento de uma dívida. Portanto, antes de ofertar ao Senhor, esforce-se para, com a ajuda de Deus, ser livre do jugo da escravidão (dívida). Um dizimista que deve ou que tem o nome no SPC é um paradoxo, o cúmulo da religiosidade que contraria todos os princípios e o espírito que está por trás de toda contribuição financeira, tanto no AT quanto no NT.

Coloque em seu coração o firme propósito de estabelecer um plano de pagamento das dívidas que o escravizam e, à medida que o Senhor lhe dá favor e prosperidade, comece a ofertar gradualmente no Reino de Deus. Com disciplina e determinação, você poderá sair das dívidas e, depois de um tempo, estar contribuindo na obra do Senhor.

Conclusão

Devemos entender que dizimar e ofertar na Casa de Deus é um privilégio que temos como cidadãos do Reino de Deus, e não uma carga. O pobre não deve ser coagido a dar, pois em nenhum dos dois Testamentos encontramos embasamento para tal arbitrariedade. No entanto, todos devemos ter como alvo reorganizar nossas finanças para podermos contribuir no Reino com as primícias de nossa renda. Lembre-se de que Deus é o maior interessado em prosperar-nos, para que uma vez que tenhamos tudo o que necessitamos, abundemos em toda boa obra e seu Nome possa ser glorificado (2 Cor. 9:6-12).

Continua na Parte 3.

© Pão & Vinho

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